terça-feira, 7 de setembro de 2010

Voltando em dia histórico

Hoje completam 3 meses que não passo por aqui pra atualizar este blog. De alguma forma me sinto decepcionado por tanto tempo sem escrever. Mas ao mesmo tempo sei que nestes 3 meses foram tantos acontecimentos, que precisei dar um tempo de tudo para voltar com força total. Quero nestes primeiros posts após minha volta, me dedicar a estes acontecimentos que ocorreram nestes 90 dias. E hoje é um dia especial para um destes eventos. Hoje, além de completar 3 meses, é também o dia em que o Basquete Brasileiro vai ser posto à prova. E é justamente sobre esta seleção que uma de minhas histórias destes 90 dias sem atualizações passa. Vale deixar como registro.

Foi no final de julho em que descobri que os treinos da Seleção Brasileira seriam abertos para os técnicos assistitrem. Leio o blog Rebote do jornalista Rodrigo Alves quase que diariamente. Me identifico e sinto uma inveja da maneira que ele consegue manter um blog além do trabalho desgastante do dia a dia. Lá, ele comentava que seria um momento em que os técnicos poderiam acompanhar e aprender um pouco com o trabalho dos argentinos Rubén Magnano e Fernando Duró.



Confesso que fiquei inquieto com esta notícia. Apesar de ser apaixonado por basquete e me considerar uma pessoa patriota. Admiro e venero a mentalidade, filosofia e o trabalho feito com o basquetebol na Argentina. Mais precisamente de Rubén Magnano e Sérgio Hernandez. Sobre Hernandez, já o tinha visto de perto em jogos de sua equipe (Penharol) contra a equipe do Universo Brasília em torneios sulamericanos. Mas Rubén pra mim, parecia ser algo inalcançável. Não sabia quando o veria em quadra aqui pelo Brasil. Até que a CBB anunciou Rubén como técnico. Desde então marquei comigo mesmo um compromisso de ver este profissional trabalhando.


Infelizmente meus compromissos profissionais me impediram de ir ao Rio para poder assistir aos treinos da seleção, e eu já me via conformado em acompanhar o trabalho de renovação de Rubén somente após o mundial.

Sérgio Hernandez e Rubén Magnano
Mas no dia 3 de agosto recebi um convite inesperado. Um grande amigo que sabe da minha admiração pelo técnico Magnano, estava na organização do Torneio Super Four que seria realizado em Brasília, me ligou perguntando se eu teria interesse de ser guia da delegação Brasileira neste evento. Era uma decisão difícil de ser tomada ali. E por isso, levei cerca de 3 segundos para responder um SIM!

Me virei no meu trabalho e fui liberado para acompanhar a seleção de quinta-feira à domingo.
Eu nem acreditava, poderia ver de perto os treinos de Rubén Magnano. Estava sendo recompensado por sei lá o que Meu Deus!

E a quinta-feira chegou! A seleção chegou com aquela correria básica de uma seleção recheada dos melhores jogadores brasileiros na atualidade e eu estava lá entre eles. Já no ônibus à caminho do hotel, vivi o principal momento que considero desta experiência. Todos os atletas e componentes da delegação foram no andar de cima do ônibus no caminho aeroporto-hotel. Eu vim sentado no andar de baixo. Sabia das obrigações de um guia e uma que me cobrava bastante era não misturar a admiração por alguns ali com o que eu tinha de fazer. Era importante manter-me de forma profissional naquele evento. Já teria os treinos para assistir e isso pra mim já seria o ápice.


Pois bem, no meio do caminho rumo ao hotel, Rubén decide sentar no andar de baixo, talvez para pensar um pouco sozinho sobre tudo. Sei que viagens em grupo são cansativas. Era um pequeno momento só e eu ali, ao lado dele. Naquele momento estava no andar do ônibus sentado ao meu lado o técnico campeão olímpico pela Argentina. Seleção que tanto acompanhei, escrevi jogadas em pedaço de papel, admirei sistemas defensivos e postura em quadra. O responsável por aquilo tudo estava ao meu lado. Eu, claro, suava frio em todos os poros do corpo. Não sou muito feito para ser fã/ tiete e essas coisas, mas aquele momento confesso que tremi e me obrigava a me apresentar a ele. Queria que ele soubesse que eu estava a trabalhar naquele evento somente por causa do trabalho dele. Enfim, não foi bem o que eu disse mas consegui me apresentar, dizer que trabalhava com basquete na cidade e que gostaria muito de levar um caderno de anotações para os treinos da seleção. Ele me recebeu bem e disse que eu deveria ficar à vontade e anotar o que quisesse tranquilamente. Claro que junto a isso, levei uma pequena filmadora de bolso para registrar algumas movimentações e situações de treinos.

Chegando ao hotel dei de frente com meu propósito naquele evento. Apesar de querer ver tudo referente aos treinos de perto, eu tinha a função de resolver diversos problemas que a seleção teria. Deveria conferir a logística de horários da seleção entre descanso, ida à academia, ida ao ginásio para treinos e horários das refeições e combinar tudo isso com motoristas, seguranças e equipe de apoio. Além disso deveria conferir e levar os uniformes sujos para lavanderia. Estava diante de um situação de humildade também. Não me sobrava tempo para curtir estar ali, era uma correria só. Mas só de sentir que estava de alguma forma ajudando na preparação da seleção rumo ao mundial, me gerava um prazer imenso. Mas claro, nem sempre as coisas aconteceram como eu queria. No primeiro treino da seleção, tive de sair na hora que o treino ficou bom para buscar toalhas sobressalentes para a seleção no hotel, cuidar da quantidade de gelo para tratar alguns atletas com imersão no gelo e essas situações se tornaram rotina para minha função até domingo. Fazia com o maior prazer do mundo mas claro que gostaria de estar ali de perto vendo Rubén comandar o treino. Acabou então que no primeiro dia de treino acompanhei pouco do treinamento. Mas do pouco que vi já havia gostado da postura de Magnano. Tive então uma atitude que considerei fundamental para que eu conseguisse assistir o treino do dia seguinte (e principal treino da seleção no evento) com tranquilidade. Já sabendo de todas as minhas funções no dia a dia com a seleção, no dia do treino bem cedo, antecipei todas as situações que poderiam sobrar pra mim no exato horário do treino. Separei as toalhas em números além do necessário, deixei a quantidade de água pronta, o gelo estava pronto para ser manipulado pelo fisioterapeuta e massagista na quantidade exata, as roupas de treino já estavam limpas e esperando apenas eu buscar na lavanderia e a logística do dia inteiro sobre os horários de saída e chegada já estavam acertadas com o motorista do ônibus, seguranças e com a própria delegação. Teria eu dessa forma a chance de assistir de fato ao treino que seria mais puxado da seleção em Brasília. SIM! Eu havia sido recompensado pela minha ação antecipada.



E assim vi um treino digno de um campeão olímpico. Aquele senhor sereno e tranquilo no hotel, atencioso com quem tentava conversar com ele, estava entregue a um simples treino. Dedicação total. Magnano tem uma capacidade de falar tranquilamente sobre o que quer do treino, da equipe e de ao mesmo tempo enquanto os exercícios são executados, é capaz de ser exigente, estar atento aos mínimos detalhes e chamar a atenção de todos. Friamente falando, não esperava outra coisa dele. Mas só quando se vê ao vivo mesmo é que temos a real noção de como ele é diferenciado de por exemplo nossa concepção de técnico de basquete no Brasil, onde quando os atletas viram "estrelas", acabamos deixando de investir nestes atletas como deveríamos porque estes tornam-se pessoas que não podem ser expostas com cobranças no grupo. Sinto falar desta forma mas o tempo que trabalho com basquete me fez ver que situações de omissão como esta existe espalhadas pelas principais equipes do país.

Magnano era intenso, inquieto, objetivo e sempre querendo mais do elenco. Em um momento uma chamada mais dura frente ao grupo, em outro momento, uma conversa ao "pé do ouvido", uma mão ao ombro do atleta, mostrando que  ele cobra mas está ali junto fazendo parte daquela evolução coletiva. Sua parceria com Fernando Duró também era excelente. Duró estava sempre procurando trabalhar conceitos no qual Magnano não abordava. Por algumas vezes Magnano cobrava uma postura mais consciente e coletiva de ataque e Duró orientava as defesas para dar trabalho ao sistema de ataque. Em outras vezes enquanto Magnano observava ao mesmo tempo ataque e defesa de forma brilhante e no qual fiz questão de ressaltar esta situação em meu caderninho de anotações, Duró corrigia movimentos técnicos, não só de defesa mas também gestos técnicos de ataque, posicionamento e finalização. Estava ali assistindo a um verdadeiro trabalho em equipe de técnico e assistente, e não o que infelizmente muitas vezes assistimos no nosso País onde o assistente é um mero anotador de estatísticas e que não pode falar muito durante o treino porque pode parecer que ele está tentando tirar o lugar do técnico (Calma! Sei que em muitos lugares do Brasil existem equipes que trabalham decentemente também).

E assim tive acesso a um treino que nem a imprensa podia participar e assistir. Pelo silêncio do ginásio conseguia ouvir e entender tudo que era cobrado e proposto aos atletas. Passei um dia de sonho vendo aquele treino. No caderno de anotações não havia apenas anotações de jogadas, conceitos defensivos e exercícios. Acabaram surgindo pensamentos soltos sobre como podemos fazer um basquete de mais qualidade no Brasil e sobre como amo este esporte que me ensina a cada dia. E assim foi até domingo. Enquanto o canal de tv que transmitia o torneio não podia colocar o microfone para ouvir o técnico Magnano a pedido dele próprio, eu estava lá colado atrás do banco ouvindo tudo e de alguma forma confirmando cada vez mais de que se tratava de um trabalho de qualidade frente à Seleção Brasileira. Passei 4 dias mágicos de aprendizado, de muito trabalho e de motivação para minha pessoa que todo dia que coloca a cabeça no travesseiro pra dormir, pensa em conseguir trabalhar com basquete de forma cada vez mais digna. De brinde, tive a possibilidade de conhecer um pouco melhor as pessoas que fazem a equipe e comissão técnica trabalhar com mais tranquilidade. Diante das minhas funções pude conhecer melhor o trabalho do preparador físico, responsável também por ajudar na montagem da logística da seleção. O trabalho árduo do médico e fisioterapeuta que tinham naquela época a missão de recuperar o Nenê e manter a seleção nas melhores condições físicas. E o mais bacana de tudo: Ficar próximo de uma figura folclórica como o Marcão. Massagista da seleção há 17 anos, pessoa responsável por um trabalho que nem percebemos muito a sua importância muitas vezes mas que eu, por ter funções em conjunto com ele, pude notar como é fundamental ter alguém dedicado a fazer o seu melhor nesta função. Marcão era responsável pela água que os atletas bebiam, pela roupa que vestiam e por manter um bom ambiente no grupo. Tive a oportunidade de conhecê-lo melhor e no último dia, a única pessoa além de Rubén Magnano que eu quis tirar uma foto para registrar esta minha experiência nova como guia da Seleção Brasileira, foi sem dúvidas o Marcão. Com seu jeitão carioca irreverente, mas acima de tudo extremamente profissional e comprometido com a seleção. Aliás, esta foi uma marca e ótima impressão de todos que compunham a delegação brasileira me deixaram. Com todos que tive uma relação de trabalho e que em momentos conversávamos sobre a seleção no mundial, todos, sem exceções em algum momento desabafavam algo como: "Vai dar certo, Rodrigo!"
Eu e Marcão na despedida da Seleção à Brasília



Todos ali tinham um pensamento muito positivo e trabalhavam duro para ver isso acontecer. E eu que sempre tive críticas( e ainda tenho) à Confederação pelos trabalhos realizados com seleções durante diversos anos, me rendi aos profissionais que ali estavam pois pude ver de perto o desejo de todos de que este mundial realmente representasse o ressurgimento do País na modalidade.

No dia de hoje, onde os dois téncicos que mais admiro e que as duas seleções por que mais torço se enfrentam, fico a espera deste jogo histórico e que espero que seja maravilhoso. Eu torcerei fervorosamente pela Seleção Brasileira. Gravarei o jogo para assistir sem emoção depois analisando os detalhes mas acima de tudo sei que em quadra estará uma tentativa dos dois lados de jogar um basquetebol de qualidade. Um tipo de basquete que gosto. Mesmo sabendo que a seleção brasileira ainda está aprendendo a se comportar assim e tendo durante o mundial recaídas para o jogo egocêntrico, ainda acredito que este será mesmo um jogo histórico, maravilhoso e marcante para todos que assistirem.

Fico na torcida pela seleção do meu País e por profissionais que passei a admirar depois de um convívio de quatro dias. E é claro que neste dia tão especial eu deveria voltar a postar por aqui. Aproveitem o jogo!

Abraço à todos!

2 comentários:

Gustavo Formiga Nery disse...

Sensacional a história. Torço pra que um dia tenta a chance de estar numa função técnica em qualquer seleção brasileira. Merece.

Gustavo disse...

Quis dizer "tenha" a chance.