quinta-feira, 3 de novembro de 2011

O gigante está doente.

Antes de ler o post, reveja, ou veja pela primeira vez, este comercial:


Assisti esse comercial tem pelo menos 3 semanas. E assim que o assisti, o procurei na internet para ver inteiro. Pensei duas vezes antes de vir publicá-lo, pois o primeiro empecilho que vi foi o fato dele estar fazendo propaganda para uma empresa de bebida alcoolica. Mas enfim, tentei passar por cima disso, pois concluí que o comercial havia instigado meu senso crítico e pensei que poderia ter feito o mesmo com tantos outros.

A cada ano que passa tenho me tornado menos fã de televisão. Hoje em dia assisto a poucos programas, pois me sinto muitas vezes próximo da idiotice ao ver o que a tv transmite. Nos comerciais então, pior ainda. Essa modinha dos comerciais terem que ser, quase por obrigação, muito engraçados (o que geralmente não são, mesmo tentando ser), me incomoda bastante. E a minha maior frustração na televisão quando vejo telejornais esportivos, é ver que a modinha da piada e gracinhas também invadiu esse meio. Confesso que fico numa luta interna entre ver as reportagens e desligar a tv, mas isso certamente será melhor contado futuramente em outro post aqui no blog.

O comercial então me despertou interesse por arriscar-se a falar do Brasil. Inicialmente me tocou muito mais por saber que no Rio de Janeiro há uma extensão rochosa beirando a orla da cidade, que em uma vista panorâmica parece formar a imagem de uma pessoa deitada. Este "monumento" natural é conhecido como "Gigante adormecido". Em um minuto de propaganda sem falas e com apenas uma frase de desfecho, o comercial tenta mexer com nossos sentimentos em relação ao nosso País. Era tarde da noite, estava perto de dormir, mas não tive como deixar passar a confusão de sentimentos que o comercial me causou. 

À esquerda a pedra da gávea (cabeça) e à direita o pão de açúcar (pé).


Inicialmente me identifiquei e me senti orgulhoso. O amor que sinto pelo meu País, vi ali representado. O orgulho de ser parte de uma nação que sofre, mas que de alguma forma tenta ser forte e crescer a cada ano, me fez olhar a propaganda com um olhar romântico, empolgado imaginando a exposição que o Brasil terá agora sendo um dos centros esportivos nos próximos anos ao sediar grandes eventos. 

Mas o romantismo não durou muito. Como me considero uma pessoa bem crítica ao que recebo de informação, comecei a me questionar: Que crescimento é esse do qual estou falando? E de que exposição estou pensando? A exposição de um País que está entre os países que mais "investe" no esporte de alto rendimento no mundo, que vai gastar bilhões e mais bilhões para construir uma estrutura para receber os jogos nos próximos anos, utilizando-se de um discurso onde versa que deixará um imenso legado para o País (você se lembra do legado que o Pan 2007 deixou?) e que continuará deixando de investir em gestão e políticas públicas para o esporte, qualificação profissional na área de formação esportiva e de professor de Educação Física. País que continuará deixando as escolas e o senso comum acreditando que a Educação Física na escola só serve pra brincar e passar tempo ou que serve para detectar talentos esportivos e espelha nossa performance olímpica (nem o 8, nem o 80.. é muito mais que isso).





Temos hoje, um Brasil que tenta se agigantar de forma errônea: Que "aluga" militares para ser campeão dos jogos mundiais militares (temos mesmo a melhor formação esportiva militar do mundo?), que leva boa parte de seus atletas de ponta para tentar mostrar que somos potência esportiva no Pan (dá uma olhada nesse link aqui se você acredita que estamos entre os melhores) enquanto outros países, ditos de ponta no esporte, tentam mesclar grandes atletas e jovens promissores que precisam de experiência internacional. 



Esse é o mesmo Brasil, aquele que é gigante pela própria natureza, que é marcado pelo uso indevido do dinheiro público, que faz estádios em cima da hora e aperta o passo para conseguir as obras de urbanização  das cidades sediantes destes eventos, atropelando projetos, e que por falta de um planejamento decente, vai gastar muito mais do que deveria com estas obras, e que mesmo assim, apesar de melhorar estas cidades, terá de fechar ruas, proibir o direito de ir e vir da população para conseguir fazer um evento seguro, e que no fim das contas dirão de boca cheia: "Tá vendo! Deu tudo certo! Mesmo contra todos que torciam contra."

Percebendo apenas algumas destas questões (isso porque existem inúmeras outras), me pergunto como anda a vida deste gigante. Ele acordou, até concordo, mas penso que ele mesmo que acordado, está doente. Deve ter adoecido por ter sofrido muito tempo com complexo de inferioridade e, sendo assim, acabou buscando caminhos errados para tentar se firmar. Esse tipo de conduta acabou fazendo com que o gigante sofresse e entrasse numa depressão profunda, onde ele sabe que é bom, sabe que tem potencial, mas por tempos agindo de forma errada, está pagando com a consciência por estar acostumado a querer as coisas de maneira fácil. Muitos olham para o gigante, admiram a sua beleza e sua imponência e dizem: "Este é o gigante do futuro!" Mas internamente a história é diferente. Lá dentro do seu consciente, há pensamentos onde afirmam que há muita coisa errada nele e que são questões difíceis de mudar.

Dessa forma, o gigante precisa de uma boa terapia (talvez seja necessária medicação), de uma franca conversa consigo mesmo e acima de tudo, precisa tomar uma decisão firme para sua vida.

 "Afinal, o que você quer da vida, gigante?
 Vai continuar orgulhoso de ter se deitado em berço esplêndido?" 




A hora é de mudança e a cada vez que sinto esse orgulho de ser brasileiro ao ver uma propaganda como essa e a cada vez que descubro que sou parte, uma pequena célula que compõe este gigante, tenho vontade de vir aqui falar que este corpo no qual habito, está adoecido, viciado em costumes e em uma vida que tenta muito mais parecer ser, do que realmente tenta lutar para ser e fazer algo diferenciado e significativo.

Cada um de nós deve lutar pela saúde do nosso Gigante Brasil. Cada um de nós é responsável por um pouco do que acontece de errado. Devemos assumir nossos erros e lutarmos para entrarmos no rumo certo. A política esportiva adotada para estes mega eventos já pegou o caminho errado. Já estamos em cima da hora e a torcida agora é para que fique o menos errado possível dentre tantos erros cometidos. Mesmo assim, ainda temos a chance de fazer algo, de votar melhor, de nos envolvermos mais, ou então vamos esperar por outra propaganda, que numa noite qualquer de surpresa, nos lembre do orgulho imenso de ser brasileiro, mesmo sabendo que estamos muito longe ainda do ideal.

Abraço a todos.

5 comentários:

Ronaldo Pacheco disse...

Lindo, comovente e real o seu texto.
Esse nosso gigante, é belo, é forte, porém descordenado, desorientado e narcisista. Seus órgãos se corrompem pelo prazer e poder a curto prazo, pelo reconhecimento hipócrita e por uma miopia congênita.
Porém existe cura, e o, remédio chama-se educação, que deve ser aplicado por professores competentes e compromissados que ativem cada uma de suas células (cidadãos) para combater os vírus e bactérias (políticos corruptos) que cada dia mais tomam conta do corpo deste belo gigante que mantendo uma atitude omissa, não cuida da sua saúde.
Abraços, e parabéns pelo texto.
Ronaldo Pacheco

Liliam disse...

É, Galego, triste constatação... O Brasil está corrompido pela ambição e assolado pela ganância. É um país onde não se oferece oportunidades para quem verdadeiramente necessita, um país redundante em todos os sentidos menos na qualidade dos serviços essenciais à população. É um país em que as decisões são movidas por dinheiro. Nosso país deveria aprender com as tragédias do presente para melhorar em curto prazo. Mas não.

Dizem por aí que este país é de todos, que somos uma potência. Como podemos pensar no futuro do país se este nem ao menos foi construído? Deveríamos começar pela educação de qualidade - educar para crescer, para fortalecer as bases, como bem disse o Ronaldo.

Ainda assim prefiro pensar que o Brasil tem futuro, mas que, no melhor dos casos, será um processo longo e difícil, e sujeito a recaídas. Já poderemos ficar contentes se a economia continuar estável e crescendo, se a violência cotidiana for se reduzindo, a educação for reforçada e se a combinação de populismo e oportunismo não terminar por inviabilizar de vez o governo. É o máximo de otimismo que consigo ter no momento…

Mas, uma ressalva: eu acredito nos brasileiros, acho que nosso maior potencial somos nós mesmos! A começar por pessoas que tentam (e conseguem!!) fazer a diferença como vc.

Beijos

Coelho disse...

Leonardo Coelho, obrigado por expressar de forma lúdica e direta a insatisfação de nós educadores com o o sistema(corpo)Brasil como um todo.Em nosso pais os políticos fazem politicagem e não politica, mas tu es uma das provas vivas que todo corpo com o minimo de resistência tem todas as chances não só de se levantar,mas se manter são. Parabéns mano.

Rodrigo Leonardo disse...

Ronaldo, Liliam e Léo,

Claro que a constatação é triste, mas podemos continuar fazendo algo, mesmo que seja pequeno dentro desse gigante todo. Hoje em dia estou focado em fazer melhor cada vez mais, para expor aqueles que enganam, fazem pouco e tentam se dar bem as custas dos outros. Afirmo a vocês: Eles estão por aí. Por toda parte. Mas nesse meio todo ainda tem muita gente querendo fazer bem feito. Então vamos fazer o nosso para estes que querem fazer algo e não sabem como, se identificarem e começarem a também produzir algo. Que tal?

Precisamos expor e nos indignar sim com os que nada querem e ocupam espaços valiosos.

Abraços.

Marcelo Mariano Nogueira disse...

Caro amigo,
Texto de grande inspiração! Belo,real mas infelizmente triste... Como disse o poeta Aldir Blanc: "O Brasil, não conhece o Brasil. O Brasil, nunca foi ao Brasil(...)Do Brasil S.O.S. ao Brasil..."