sábado, 10 de setembro de 2011

Sobre alunos e professores

Ontem em uma aula de educação física na escola, programei uma situação onde meu objetivo principal era fazer com que os alunos percebessem a necessidade de organização em diversos tipos de atividades, desde brincadeiras, até jogos esportivos. Tenho tentado mostrar aos alunos que o que nos acontece nos jogos é um pouco reflexo do que somos em sala de aula e por que não dizer na vida. Como planejado, alguns jogos geraram diversos conflitos de organização e como já esperado, tive de ir aos poucos intervindo tentando ajudar os alunos a perceberem que se organizar é uma tarefa que não garante o êxito, mas que te mostra caminhos escolhidos e a longo prazo pode ser capaz de te mostrar o que você pode fazer para melhorar.


Além disso, a riqueza de trabalhos assim é ver o quanto eles ainda têm dificuldade de se relacionarem e entenderem que nem todas as ideias podem ser assimiladas e praticadas ao mesmo tempo. Tudo então se torna um processo e o importante disso tudo, é ao final da aula, tentar avaliar os erros e acertos e quais tentativas ainda podem surgir para as próximas situações de aula. 

Mas confesso que uma fala de um aluno hoje me chamou a atenção e me lembrou algo que pensei recentemente. No meio do jogo, este aluno notou que sua equipe não conseguia manter a sua prévia organização. A equipe deu diversas ideias para serem praticadas no jogo, mas de acordo com a imprevisibilidade do jogo, com a atuação e oposição do adversário e a pouca comunicação entre eles, muitos começaram a tentar encontrar soluções sozinhos, o que acabou não dando um efeito positivo pra equipe (nem sempre é assim, as vezes reações assim acabam dando certo e é preciso saber intervir) e a partir daí a equipe começou a se desmotivar e a atuar pouco coletivamente. Percebendo este fato, fui em um aluno que considero influente na equipe e em meio ao jogo acontecendo o questionei do porquê que eles não tentavam se organizar pra melhorar a partida. Ele de uma forma um pouco desmotivada me respondeu: "Eu estou tentando, mas o grupo não quer ajudar!" 

Muitas vezes é bem mais fácil resolver os problemas do jogo sozinho com suas próprias habilidades.
Pensei rapidamente sobre essa resposta e perguntei a ele quem era esse grupo. Ele rapidamente me disse que era sua equipe. Aproveitando essa deixa, tentei questioná-lo se ele não fazia parte desse grupo e se talvez ele também não estivesse tentando o necessário para tentar melhorar. Disse a ele que muitas vezes quando vemos as coisas difíceis, acabamos por falar dos outros isoladamente como se não fizéssemos parte disso. Tivemos uma boa conversa, apesar de rápida, e levamos essa discussão para a conversa final da aula.

Esse fato me lembrou que dia 1º de setembro tivemos a "comemoração" do dia do profissional de educação física. Sinceramente não ligo muito pra esse dia que foi criado muito mais por uma tentativa de legitimação do conselho federal de educação física do que por qualquer outra coisa. Pra mim, nosso dia é 15 de outubro, dia do professor, pois assim me sinto, um professor acima de tudo. Mesmo falando assim sobre essa "data festiva", não vejo muitos motivos para festas, nem também recuso os parabéns pela data. Penso que com essa data até tenho chance de falar um pouco mais sobre minha área de atuação onde trabalho. Mas as coisas param por aí. Quando vejo tudo o que cerca essa data, vejo dois extremos que me preocupam. Primeiramente os relatos que vejo sobre o curso de educação física, vejo professores muitas vezes com anos de carreira em faculdades, com títulos acadêmicos, dando os parabéns para os professores, dizendo que a área é relevante porque gera alegria, porque é muito bom dar aula, porque os alunos são bacanas. Sinceramente, não é isso que me motiva na área e talvez relatos como esse me causem mais tristezas do que alegria. Há muito tempo vejo as pessoas resumindo a nossa área como a área da diversão. Amo o que faço e claro que me divirto com isso. Mas não seria a palavra que eu usaria para resumi-la.


Por outro lado vejo muitos indignados com as condições de trabalho e seus salários, seja na escola, academia ou onde quer que seja. E muitas vezes estes "colegas" apontam dizendo que não dá pra fazer muito com um reconhecimento assim. Do mesmo jeito que vejo muitos protestando contra o trabalho do conselho federal e regional de educação física. Acho bacana a iniciativa de tentar fazer a diferença, mas me incomodo quando vejo que muitos que reclamam, trocam suas energias que poderiam ser também canalizadas para investirem em fazer boas aulas, e estudar mais a área, para ficarem no campo dos protestos, e assim,  não "dão o gás" pra tentar fazer a diferença dentro de seus trabalhos. E aí me lembra muito meu aluno da aula de ontem. É como se muitos professores que protestam dissessem que ele está tentando fazer algo bacana, mas o grupo (sociedade, leis, administradores) não está querendo.

E quem é este grupo então? Somos nós, professores que devemos hoje em dia lutar por uma aula melhor, por oferecer um conteúdo significativo aos nosso alunos e devemos tentar ressignificar a nossa imagem de "oba boa". Me cansa ver professores que escoram seu trabalho apenas em seu carisma, que querem ser "gente boa" pra não serem contestados. Atuarem de forma permissiva pra não levarem problema pra casa. Esse sim, ao meu ver, é um grande desafio que devemos tentar mudar sobre o professor de educação física. Muitos reclamam com razão daquele professor "rola bola" que não tem nada a acrescentar. Mas também deveriam criticar aquele que não ensina direito os movimentos, que não incentiva a aprendizagem motora com um discurso falso moralista de que trabalha o social em prol da formação humana.

É mentira! Estamos cheios de professores em nossa área que não estudam e trabalham com os conceitos e teorias apenas vindo da faculdade. Não se renovam e ficam se prendendo a antigos discursos porque querem o mínimo de problema possível, como se nas outras áreas fosse tranquilo trabalhar e não houvesse problemas. Ainda existem aqueles que dispensam os alunos mais cedo porque a aula é pratica e com poucos alunos vai acabar deixando todos muito cansados, como se não houvesse mais o que se aprender além da prática. Isso existe muito em diversas escolas e (pasmem) em faculdades. A mensagem que está sendo passada é essa: Não temos tanto assim pra acrescentar em nossos alunos. Esse lado eu  realmente não aguento mais e vejo muitos atuando como se fossem pequenos alunos, reclamando do grupo, das condições "do jogo", mas fazendo pouco por ele. Por isso, quando sou parabenizado e questionado do que eu acho do dia do profissional de educação física, ao invés de fazer um discurso político contra tudo, prefiro ter a chance de falar sobre nós professores, que ainda estamos devendo em nossas atuações.

Nessas duas últimas semanas estive participando de algumas aulas no ensino superior de educação física onde o tema era sobre a intervenção pedagógica na escola. Tentei falar sobre isso. Apontei situações de êxito que obtive em meus trabalhos, mas tentei não deixar parecer que tudo é "bonitinho", porque não é. Nessas aulas pude ver diversas pessoas que querem encarar a escola e tentar fazer algo bom com o que tem e isso me deixou profundamente motivado. Mas sei que lá dentro o perigo é de muitos se contaminarem com os "zumbis da educação" (farei um post melhor em breve sobre esse termo) que não querem trabalho.  Trabalhar dá trabalho e você não se diverte o tempo todo. Mas pra quem acredita no que faz, o produto ao longo do tempo é recompensador. Para alguns é recompensador porque o trabalho é "sossegado" (infelizmente já ouvi muito isso), mas enfim, nessas horas descubro que meu aluno que estava desmotivado na minha aula por causa do problema difícil de resolver no jogo, mal sabe o que espera por ele. Lá na frente ele descobrirá adultos que dão aulas sorrindo e brincando, mas que por trás não aguentam mais a área e que querem se ver livre daquele trabalho. Espero ajudar estes meus alunos a compreenderem que esses desvios existem, mas podemos fazer diferente.

Não pense que esse meu post me mostra pessimista pela minha área de atuação ou que penso que a grande maioria dos professores não prestam. Muito pelo contrário, sou apaixonado pelo que faço, pelo que estudo e pelo que aprendo com meus alunos e sei que existem muitos professores envolvidos, capacitados e que não se rendem às situações de adversidade que lhe aparecem. Mas penso que hoje em dia precisamos expor mais aqueles que enganam dentro das academias, salas de aula e quadras em nosso País.

Eu me decidi, pelo menos no dia de hoje, a falar e fazer um pouco disto.

Espero nos encontrarmos em breve por aqui.

Abraço à todos

2 comentários:

Ronaldo Pacheco disse...

Rodrigo,
quem te conhece sabe que você não está passando pessimismo nesta análise, mas sim fazendo um alerta importante e verídico para nossa área.
Sua forma de trabalhar demonstra o seu compromisso com a profissão e hoje você é um exemplo para muitos professores. Continuemos nossa luta contra os "zumbis" e os "medíocres". Nossa arma é o nosso trabalho de forma digna e comprometida.
Parabéns pelo texto e pelo dia 1º de setembro.
Abraços,
Ronaldo Pacheco

Rodrigo Leonardo disse...

Valeu, Ronaldo.
Mas sinceramente não aguento mais falarmos apenas em rodeios. Ando com um pensamento de expor mais sobre estes profissionais que pouco estudam e enrolam os outros com discurso. Penso que devemos estimular os leitores daqui a serem mais críticos com o que recebem de conteúdo destes "mestres"

Abraço