sábado, 1 de setembro de 2012

1º de Setembro. Dia de perguntar: Você está fazendo a sua parte?

Hoje é o dia do profissional de Educação Física. Como já disse outras vezes aqui no blog, é um dia normal como qualquer outro. Considero de verdade o dia 15 de outubro (Dia do Professor), mas não sou rebelde ao ponto de não aceitar os parabéns pelo dia de hoje ou qualquer tipo de felicitação. Aceito e sempre tento aproveitar pra poder falar sobre o tema e a profissão. 

Como também já disse por aqui. A criação desta data é uma estratégia do conselho nacional de educação física e seus conselhos regionais para se legitimar no mercado. Eu sinceramente tenho minhas críticas ao conselho. Não sou contra a legitimação da profissão por meio de um conselho, desde que este vise investir na profissão com uma formação continuada e uma busca por melhor qualidade de aula para estes professores. Mas não é isso que acontece. Tenho de pagar mais de quatrocentos reais por ano ao conselho pra apenas dizer ao mundo que eu sou professor de educação física. Para isso tenho o meu diploma, estudei pra me tornar professor e não precisaria de um órgão pra dizer isso por mim. Sabemos muito bem o histórico do conselho (sei bem pelo menos da região centro-oeste) e por muitas vezes o conselho teve atuações muito mais visando lucro do que com o ideal de fortalecer a categoria de profissionais. Tenho amigos que trabalham lá dentro, sei que tem gente séria, mas sinceramente não acredito no ideal do conselho e sua atuação. Vem eleição por aí e torço pra que possam dar uma direção diferente a essa realidade.


Mas não era sobre isso que eu queria vir falar aqui. Na verdade eu queria dizer que enquanto muitos vibram, festejam, gastam com propagandas na tv parabenizando os profissionais de educação física, eu aproveito a data pra perguntar: 

Estamos fazendo a nossa parte? 

Sinceramente eu tenho dúvidas sobre a resposta.

Recentemente vi casos absurdos de atuações profissionais e fico me questionando o caminho que estamos tomando na profissão e principalmente na formação de novos professores. Vou contar alguns casos pra vocês.

Fui convidado pra dar uma aula em uma disciplina do ensino superior do curso de educação física e lá o professor é bastante envolvido e gosta de trabalhar com os alunos não apenas no formato prático, mas com textos e leitura de artigos também. Ele diz que é um investimento em seus alunos e uma tentativa de torná-los mais críticos. Mas ao final dessa aula na qual participei, saindo da aula eu ouvi o "desabafo" de um dos alunos para um colega: 

"Esse professor viaja demais, ele acha que só temos a matéria dele para fazer. Não bastasse a aula ele ainda quer que façamos resenhas de artigos."

É isso mesmo que você entendeu. O aluno estava chateado porque tinha de estudar. Meu questionamento imediato ali comigo mesmo foi: Aquele desabafo era uma distorção, um ato isolado, ou é uma máxima da educação física? Não temos de ler? Como seria esse aluno então fazendo medicina? Achei absurdo e sintomático essa declaração.

Outro professor universitário assumiu ano passado a cadeira da disciplina de basquete(Graças ao bom Pai ele não está mais a frente dessa disciplina). Há muitos anos ele não lecionava essa disciplina e simplesmente não se preparou pra ela. Veio com conceitos antigos ensinar os alunos e sempre que questionado que a aula era muito "vaga" com conceitos muito superficiais, ele discursava dizendo que trabalha num estilo democrático, onde os alunos aprendiam sob descoberta orientada. Resumindo: Ele usou de alguns conceitos de estilos de ensino para explicar sua falta de estudo. Mas ele foi além. Ao ensinar o movimento da bandeja para os alunos universitários, ele simplesmente ensinou com os alunos tendo de pular bolas para aprender a fazer as passadas. Esse modelo não é mais utilizado acredito que pelo menos a uns trinta anos. Além de antigo e não eficaz, ele é perigoso, pois o aluno pode pisar na bola, cair e se machucar. E infelizmente foi isso que aconteceu. Uma aluna pisou na bola literalmente, torceu o tornozelo e rompeu ligamentos do mesmo. Esse foi o ensinamento de um professor "conceituado" no mercado. Isso era o que ele passava para os futuros professores de educação física.

Tem muito professor parecido com o personagem Rolando Lero


Em outra universidade, um professor é famoso por no dia de quarta-feira, que ele teria de dar aula até às 22h40 na universidade, liberar os alunos mais cedo (por volta de 21h30) porque quarta-feira é dia de futebol na tv! Vocês acreditam nisso? Uma vez por semana ele negligencia 100 minutos de sua aula (imagina esse somatório em um semestre). E os alunos o que fazem? ADORAM! 

"Esse professor é massa, entende o nosso lado." 


Foi isso que já ouvi dizer sobre ele.

Outro professor (essa caso é clássico) coloca um estagiário/monitor/amigo/ algo que o valha para dar aula em seu lugar. Ele é um professor doutor e tem muitos afazeres. Pouco aparece na sala, não acompanha a evolução dos alunos e no fim, diz que está investindo na formação de um novo professor. Eu não tenho nada  contra o professor que investe em um monitor para dar algumas aulas. Mas sou contra o professor que simplesmente se omite do seu ofício para pegar esse horário e trabalhar em outras coisas. É isso que acontece demais. E os alunos? Precisam fazer a matéria, muitas vezes o estagiário não tem tanta competência ou poder para avaliá-lo, então a matéria torna-se mais "fácil de passar", então está tudo certo.

Por fim, esse é o mais curioso. Um professor que passa no início de semestre textos em espanhol, pois dessa forma muitos alunos vão levar mais tempo lendo e assim "gastarão" mais tempo de aula e ele não precisará dar nada de matéria. Nada contra quem passa texto em língua estrangeira, desde que este seja um ato com intencionalidade pedagógica. Esse na minha visão se parece com aquele professor de escola que quando vê que em sua aula em quadra aberta, o tempo começa a nublar e fechar, ele já fala pra turma que pra segurança de todos os alunos não vai ter aula porque está com perigo de chover e de ter raios. Leva eles pra sala,deixa eles batendo papo(Já que, segundo estes, não há o que ministrar de aula de educação física em sala). Acreditem, isso existe muito. 

E por que contei todas essas histórias? Por que em praticamente em todos esses casos, o que os alunos fizeram para protestar? No caso das universidades, todo fim de semestre os alunos necessitam fazer uma avaliação de cada professor. Ali eles têm a chance de mostrar um pouco da realidade. Mas devido a um pacto da mediocridade absurdo e quase que cultural brasileiro, em muitos lugares os alunos colocam avaliações positivas sobre todos os professores. E pronto, o ciclo da mediocridade está a pleno vapor.

Recentemente tivemos o sucesso nacional da aluna Isadora Faber (clique aqui pra saber sobre esse caso) que começou a mostrar na internet os problemas de sua escola e que nos colocou essa questão no ar: 

Isadora Faber e seu Diário de Classe


O que estamos fazendo para exigir aulas e profissionais de qualidade?


Hoje não tirei o dia pra comemorar. Tirei o dia para desabafar sobre essa realidade que continua reforçando que o professor de educação física é um cara carismático (ser só isso é muito pouco), que é criativo (já que nas escolas não há material adequado pra dar aula e o professor precisa improvisar) e que não estuda constantemente. Essa é sim, ainda uma realidade comum em nosso meio. E pior, reforçada e legitimada por diversos professores, mestres e doutores que estão na universidade, "fugindo" de dar aula de verdade. Seja mais crítico em seu olhar e você verá, eles estão por aí tomando conta ainda de muitos espaços.

Mas não pense que eu vim aqui fazer um post pessimista e determinista desse jeito. Eu falo tudo isso porque me indigno mesmo com quem toma espaço de bons profissionais apenas por títulos e nome, mas acredito muito no surgimento de bons profissionais. Hoje em dia tenho o prazer extremo de trabalhar cercado de bons profissionais e vejo estudantes de educação física já muito mais críticos ao que recebem de informação. Há dois meses atrás, participei de um curso de capacitação para professores da rede de ensino do DF que trabalham com treinamento esportivo nas equipes escolares. Fui receoso, com medo de que eles estariam fechados em seus mundos restritos a novas informações. E o que vi foi um grupo de professores (em torno de 70) muito afim de aprender. Sim! Essa é a palavra. Alguns com mais de 20 anos atuando como professor e simplesmente ávidos por aprendizado, informação e pela chance de tornar suas aulas mais dignas e capacitadas.

Nesta quinta-feira estive com eles novamente e falei o que escrevo aqui agora. Tê-los conhecido e vivido esse curso com eles, mexeu diretamente com meu trabalho. Me tornou mais crítico, mais responsável com minha profissão, mas me deixou mais esperançoso de que podemos sim fazer um trabalho de maior qualidade. Existe muita gente boa por aí, o que precisamos é sermos críticos e diretos com aqueles que tentam reforçar que Educação Física é uma disciplina divertida e feliz. Educação Física é muito mais que isso. Ela também é trabalho árduo, esforço e estudo diário, mas pra quem gosta e vê sentido no que faz, tem um retorno incrível quando vemos que podemos influenciar e alterar de maneira positiva o cotidiano das pessoas.

É nesse misto de revolta com o que temos por aí e esperança e confiança naqueles que fazem valer a pena essa profissão que eu pergunto: 

Você está fazendo a sua parte? 


Espero que sim e que continuemos fazendo para termos um dia o que comemorar de verdade.

Parabéns professores e estudantes de Educação Física.

Ofereçam e exijam aulas de qualidade baseada no estudo e não na amizade e no bom papo.

Abraço a todos.